Mais uma maravilhosa passagem de ano, desta vez de década. Lá nos fomos, qual nos iremos por mais 10 anos, talvez. Um belo concerto em Viena, o Neujahrskonzert, no Musikverein. Depois o retorno a Paris, onde me aguardava um livro que comprei e cá me entregaram. Um livro interessante, a respeito dos brasileiros em Paris ao longo do tempo e dos bairros desta cidade que me encanta. Esta cidade na qual passamos, minha mulher e eu, metade de cada ano.
Um livro interessante. De um lado porque conta estórias - não histórias - de nossa gente por aqui. De outro porque nos deixa frustrados, na medida em que ignora momentos marcantes de muitos, muitos de nós por aqui.
Belas memórias, qual a de Arthur e Clélia Pisa, meus amigos que já se foram para o céu mas é como se ainda estivessem por aqui. Nas peças de arte de Arthur que guardamos em Tiradentes, na memória de belas histórias a mim relatadas por Clélia e no quanto Monique le Moing guarda deles em sua memória. Minha amiga Monique, que traduziu inúmeros livros do português para o francês e é responsável pela publicação, aqui, do Le flâneur de Saint-Germain-des-Prés.
Além disso, memórias de Celso Furtado e da Rosa Freire de Aguiar, sua esposa que ainda por aqui de quando em quando está, com quem jantaremos - com ela e a Amelinha do Reali Junior, que também já está no céu -, semana que vem.
O livro que agora tenho em minhas mãos nada, contudo, diz a respeito dos brasileiros que cá estiveram, em Paris, ao longo do tempo da ditadura que suportamos a partir de 1964. Aí, onde a brisa fala amores, nas lindas tardes de abril.
Nosso camarada Armenio Guedes, cuja memória será relembrada em um belo livro a ser publicado pela Globolivros no próximo mês de março. O "Tio", como chamávamos, aqui na velha Lutèce, recebeu e acomodou os que daí fugiram naqueles tempos duros e sofridos. Um punhado de amigos, dos quais me basta lembrar, aqui e agora, o frei Oswaldo e o Aloysio, meus irmãos de coração. Mencionar-se brasileiros em Paris sem referi-los é incompreensível.
Pois a vida de todos foi como que conformada, remoldada pelo exílio. Aloysio retornou ao Brasil em 1979, após a promulgação da Lei da Anistia, tendo sido, além do mais, deputado estadual, vice-governador de São Paulo, deputado federal, ministro da Justiça no governo Fernando Henrique, senador e ministro das Relações Exteriores.
Tudo passa, é verdade, mas é lastimável que a memória de brasileiros que no exílio cá estiveram seja ignorada. Suponho, na verdade tenho certeza, de que o "Tio" está sorrindo, lá de cima, como a dizer não façam mais isso!